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José Loureiro

19.04 07.06.2008
Galeria Fernando Santos
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José Loureiro
19 de Abril – 7 de Junho 2008

Sobre um fundo constituído por intensas colorações — amarelo cádmio, lilás, verde permanente, vermelho cádmio escuro e vermelho cádmio claro ou azul cobalto — evoluem traços negros. A rectaguarda das cores, em fundo, estabelece uma anterioridade em relação às figuras (plenos traços negros) que completam as obras. Como se as cores tivessem aguardado um tempo de espera. Espaço preparado em cor, uma ideia de ante-manhã, uma fisicidade atmosférica, expandida vibração de um campo monocromático inicial. Cor única em absoluto domínio, modelada para receber incisivos traços de um negro profundo e ainda traços mais leves igualmente negros. Estes funcionam como uma imprecisão, como um movimento inquieto e «desarranjado» (a palavra é do pintor) o qual se prolonga, confunde, anula ou se distancia da figura alongada, geométrica e rectangular, formada pelos traços de negro intenso.

Surgem igualmente quatro óleos de fundo branco. A presença desta profundidade branca traça um contínuo com os últimos que José Loureiro mostrou na Galeria Cristina Guerra, Lisboa, 2007. Nesses trabalhos, tracejamentos negros, evolucionavam sobre o espaço do branco, a um só tempo orientado e fugaz. Também nestas novas pinturas de predominância do branco, tal como no conjunto das outras obras presentes, vai permanecer uma relação através de um desdobrar de sensações espaciais — no instante em que os mais leves traços negros se separam e evoluem da linha negra que os espelhou — e através de uma projectada dinâmica, que funciona como um ponto-horizonte, através de que vibra a projecção da sua luminosidade e da sua imagem para uma não calculada distância. Uma vibratilidade a cada momento se desloca (agora, imaginariamente,) dentro do quadro, consoante a incidência do traço ou do ângulo ou mesmo do jogo criado entre as monádicas e alongadas figuras.

Uma arte de viver a pintura surpreende-nos com o novo, modificações do espaço da visão que José Loureiro cada vez mais acentua, e por aí se torna um dos mais entusiasmantes e emotivos pintores portugueses actuais. Será suficiente pensarmos e visualizarmos os trabalhos que têm vindo a ser mostrados ao longo de 2007-2008 em Lisboa: desde os pequenos formatos no Espaço Chiado (pintura), às maiores dimensões na Galeria Cristina Guerra (pintura), aos desenhos de A Palavra, na Cinemateca Portuguesa, até à Galeria João Esteves de Oliveira (desenho) em Lisboa. Exposições que se prolongam, num constante diálogo entre uma temática abstracta e uma formulação figurativa, neste conjunto de telas de sentido e sentimento abstracto na Galeria Fernando Santos, no Porto.

Agora, o azul cobalto de uma das telas deixa-se enquadrar pelo traço negro; o amarelo cádmio de outra surge com as sotoposições de anteriores pinturas, onde um quadrado e um traçado rectângulo, bem delineados, dão lugar a sombrias duplicidades; ou uma tela lilás revela, nos seus estreitos e riscados negros, o plano mais sujo das sombras. Enquanto os óleos vermelho cádmio procuram, num paralelismo inexistente, os confins de si mesmas. Enquanto pintura autêntica. Absoluta.   

João Miguel Fernandes Jorge
In catálogo da Galeria Fernando Santos, 2008