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Daniel Barroca, Pitteloud, Macotela, Hellerup, Zdelar, Van den Bosch – On Not To

17.09 29.10.2011
Galeria Fernando Santos (Espaço Padaria Independente)
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On Not To
Espaço Padaria Independente
17 Setembro | 29 Outubro

On Not To resulta do encontro entre Annaïk Lou Pitteloud, Antonio Vega Macotela, Carina Hellerup, Daniel Barroca, Katarina Zdelar e Steve Van den Bosch.
Na Galeria Fernando Santos é apresentada uma constelação de trabalhos que gravita em torno da noção de  obra incompleta implicando directamente o espectador enquanto agente necessário para o seu funcionamento ou não.
Em paralelo à exposição será apresentado um catálogo cuja forma é um texto redigido em colaboração que consiste na correspondência entre os artistas. Este texto bem como a forma da sua publicação tem a estrutura aberta de um corpo ramificado e em progressiva expansão que pretende abrir um espaço não regulado nem hierarquizado de articulação entre as diferentes vozes que contribuem para a exposição. 

On not to é o resultado do encontro de amigos que partilham afinidades no trabalho e na vontade de articular no espaço um cenário comum.
Estas práticas divergem bastante e por vezes contradizem-se entre si mas também apresentam aspectos complementares. Um desses aspectos poderia ser descrito como a criação de uma órbita em torno de um centro vazio para a seguir operar a partir das suas margens. Podendo isso acontecer através do desvio do contexto da exposição, aparecendo enquanto subtexto, carregando temporariamente de forma especulativa esse centro vazio, conjecturando acerca de determinados detalhes ou utilizando uma narrativa fragmentada. Quebrar com uma leitura directa da obra é uma intenção clara.
Desta forma, a exposição sublinha a preferência dos artistas em não reconhecer uma finalidade exclusiva e deixar uma abertura, o já mencionado centro vazio, para o espectador se envolver considerando as suas próprias expectativas, associações e referências. A constelação criada para esta exposição considera o espectador como um agente necessário para esta articulação. Ele ou ela é considerado um cúmplice cujo papel é essencial.
O título da exposição é duplamente dobrado, dependendo de como as palavras são acentuadas; On nót to anuncia a abordagem do artista como sujeito; enquanto Ón not tó, refere-se ao envolvimento activo do espectador em oposição a um espectador tradicional sujeito à obra.  Ao descrever possíveis ligações entre 5 dos trabalhos apresentados nesta exposição gostaríamos de sugerir um percurso para os nossos visitantes sem que isso seja uma tentativa de solidificar possíveis articulações.
O trabalho de Steve Van den Bosch>I know, but when you ask me I don’t. < permanece invisível até que o espectador passa por ele por acaso, ele ou ela encontram-no em vez de o abordarem conscientemente. Sempre que isto acontece o espectador é ligeiramente obstruído no seu movimento livre ao cruzar a sala e é ‘apanhado’ – como numa fotografia – por um breve segundo. A obra pretende ser um momento sensorial com um resultado visual crescente e um resultado auditivo decrescente (é de pensar no típico som derrapante de quando se pisa uma mancha pegajosa no chão) dependendo do nível de saturação do material. Uma vez que a mancha se torna seca e visível, ao tornar-se pura imagem, a obra transforma-se na documentação do seu procedimento. Um aspecto central nesta peça é o papel do espectador literalmente como co-produtor no seu processo de criação, exposição e percepção. O título refere-se a um momento em que nos damos conta que um conhecimento específico é inacessível quando abordado directamente, em que algo que pensávamos saber é repentinamente branqueado ou quando uma certa memória aparece distintamente sem ser anunciada ou induzida. Murmurs < de Antonio Vega Macotela, lida igualmente com a ideia de presença incerta e obstrução. Esta obra consiste num sinal abstracto impresso como anúncio num jornal. Este código é um sistema de escrita anamórfica que revela a mensagem escrita apenas se esta for lida do ponto de vista certo. É necessário que o espectador assuma uma posição de joelhos com o peito e o queixo contra a parede enquanto se olha para cima, uma posição que evoca uma oração ou uma execução. Aqui a obra já é visível mas mantém-se inacessível para o espectador que necessita de conscientemente adaptar a sua posição física para a poder ver.
A obra de Macotela é feita a partir de um código secreto desenvolvido por prisioneiros de uma prisão mexicana que é introduzido no domínio público. Neste sentido, o trabalho também questiona o jornal enquanto meio de informação ao ser utilizado como a publicação de mensagens codificadas.
A problemática de distribuir ideias é também abordada no trabalho de Annaïk Lou Pitteloud > Agit-Prop <. A mensagem neste trabalho não foi encriptada, simplesmente desapareceu. Uma estrutura vazia feita de tiras de cartão desenha uma demarcação rectangular no chão da galeria. Ao emoldurar uma pequena parte do espaço expositivo indica ao mesmo tempo o exterior e o interior como parte do mesmo continuum. Referindo-se ao género de propaganda de agitação constrói uma reflexão sobre os meios utilizados para propagar ideias. Será a mensagem limitada pelo formato ou vice-versa?
Em > Shoum < de Katarina Zdelar, o uso da linguagem é explorado como tecto de códigos sociais, como negociação de identidade e como possível elo de ligação para uma comunidade. Este video foca uma prática “infantil” de aprender sem compreender. Uma pessoa de meia idade oriunda de Belgrado (um membro da geração que cresceu durante o regime de Milosevic) é filmada durante o processo de descodificação da letra de um dos  grandes hits dos anos 80 “Shout” da banda Britânica de new-wave / pop romântico “Tears for Fears”. Sem poder falar inglês ele transfere o que ouve para o seu próprio “vocabulário” baseado na sua capacidade de vocalmente interpretar e reproduzir o que está a ouvir. No sentido de captar e memorizar a letra ele escreve o que foneticamente compreende. Erros e deformações dos versos criam uma divertida “nova linguagem”. Ele acaba por cantar a sua versão da letra de acordo com o que escreveu.
A gravidade política, a forma de como o nosso sentido de comunidade e de pertença é moldado através da linguagem, lembra também aspectos da obra de Macotela. Com < 5 Imagens Obstruídas, Daniel Barroca lida de forma obliqua com a violência de um passado colonial. Nestas imagens, um grupo de soldados portugueses está sentado à volta da mesa algures na Guiné-Bissau. A atmosfera festiva nestas imagens contradiz as expectativas mais gerais sobre fotografia de guerra. A incerteza criada por estas imagens permite uma entrada em instantes nos quais as narrativas históricas podem ser habitadas e ligeiramente desviadas. Ao cobrir os rostos das figuras com contentores de água turva a leitura imediata é obstruída e partes marginais da imagem são destacadas. Esta obstrução questiona a construção da história e as suas ligações a memórias pessoais, como se estas
duas noções estivessem em constante refutação.