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Manuel Amorim – Travessia(s)

04.06 30.07.2011
Galeria Fernando Santos (Espaço Padaria Independente)
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Manuel Amorim
Travessia(s)

4 Junho a 30 Julho 2011

“Je me sens coloré par toutes les nuances de l’infini…” (Cézanne)

Manuel Amorim – Travessia(s) – Espaço Padaria Independente (Galeria Fernando Santos)

“O que apela o espectador em primeiro lugar nas obras de Manuel Amorim é o silencioso espaço-cor de cada imagem, este campo de experiência vasto que se oferece ao olhar para o poder percorrer demoradamente.
O olhar, feito pura percepção, move-se por dentro da sua matéria cromática, quebrada e subtil, – lilases, laranjas, roxos, terras de Siena, cobre ou ainda verdes metálicas e azuis – que o leva de acidente em acidente, densificando-se em lugares mais escuros, tornando-se transparente e luminosa noutros.
Na sua vibração cromática, depurado de todos os indícios que possam sinalizar qualquer correspondência com o mundo do visível, o espaço-cor cativa-nos pela partilha da sua força energética e vital que reverbera por além dos limites da tela.
Outro chamamento imediato emana dos exíguos vultos humanos que se configuram nesta imensidão espacial.
Duas personagens a trilharem uma subida, uma à frente, firme e determinada, cheia de energia, outra que lhe segue, arrastando-se num passo cambaleante.
Em variações imagéticas que compõem esta mais recente série do pintor, este par, como que desdobrando as polaridades inerentes à existência humana, cumpre, numa solidão desmedida, a sua errância entre o peso gravitacional terrestre e a leveza do ser em estado de graça.
Travessias penosas onde, na luta travada entre as forças abismais e a aspiração de ascensão, as imagens interpelam à perplexidade da infinita beleza que amadurece em cada instante da caminhada.

Este núcleo denso de imagens junta-se a muitos outros que Manuel Amorim realizou ao longo de mais de 40 anos de um incessante trabalho.
Nunca as suas imagens deixaram de centrar-se no ser humano, nos seus desejos e medos, nas suas emoções, memórias e aspirações mais profundas.
Nas suas personagens, feridas pelas circunstâncias condicionantes da vida, a melancolia transforma-se, contudo, num estado de constante vigília e confere-lhes a sua presença imanente.”

Gisela Rosenthal
Lisboa, Maio de 2011

Breve nota biográfica:

Manuel Amorim (Lisboa 1950) instala-se em Paris em 1970.
Em 2009 regressa a Portugal. Actualmente vive e trabalha no Porto.
Nos anos parisienses Amorim autodidacta, em diálogo constante com outras formas de arte e representação, frequenta assiduamente ateliers de artistas como Vieira da Silva, A.Szenes, Bram Van Velde, Alechinsky, Michel Haas, J.M. Broto,
os fotógrafos A.Morain, J.M. Del Moral, entre outros… Conhece Louise Bourgeois, Julian Schnabel, J.M.Sicilia, Aki Kuroda, Thomas Shliesser, James Brown…
Manuel Amorim, destaca-se na pintura como um artista cujo percurso, longamente vivido e reconhecido fora, se afirma pela via da coerência e fidelidade a uma ideia muito pessoal do que é pintar.
A sua obra é-nos dada de uma forma existencial e enigmática… Com uma serenidade contagiada por vezes com ironia e humor, o artista precipita o
espectador numa aventura singular de percepção plástica: território ligado à “metafísica” e a tudo o que toca à “anima” (absoluto, perigoso, tabu e mágico…).
As imagens, ligadas por uma corrente subterrânea a um Romantismo sem “pathos”, partem à conquista de ver um pouco mais claramente de que maneira o Homem sente a sua “alma”; momento em que o “Homem que pensa” regressa à função original do seu ser… Ao ponto em que produzir e saber têm a mais estranha relação e, se abismam na contemplação deste
primordial fenómeno…
Envolto(s) na(s) sua(s) “matéria(s)-pele(s)”, a(s) figura(s) antropomórfica(s) – o espaço pictórico inteiro – é transmutado num organismo de memória e prospectiva onde se cruzam a unidade conceptual de grande depuração plástica (densidade e tensão das matérias) e, em contraponto, uma secreta comunhão com um “sagrado” de registo trágico-cómico.