Nikias Skapinakis
Imaginações 2008/2009
18 Abril a 27 Maio 2009
A Perenidade da Pintura
A primeira batalha que um artista deve travar é esquecer a Arte Europeia – esta afirmação de Donald Judd identifica, de facto, a situação de ruptura nas actividades artísticas, no decorrer do século passado.
A ruptura, isto é, a ausência de relação com o passado, mais do que o corte efectuado por Duchamp, criou uma nova problemática artística.
Muitos artistas não necessitam recorrer aos ensinamentos antigos e ignoram o passado histórico. Mas a alteração relativamente ao tempo de Duchamp consiste, julgo, no facto de que deixou de ser necessária uma transferência conceptual de um urinol para uma fonte.
Os w.c. e muitos outros objectos e maquinarias forjadas pela tecnologia e pelo design contemporâneos passaram em muitos casos a dispor de uma beleza inerente. Um porta contentores, um parque de eólicas, uma sonda espacial ou até detritos acumulados – os exemplos são infindáveis – podem revelar uma impressiva beleza, surpreendente.
O belo envolvente e quotidiano tem porém uma consequência: concorre, muitas vezes com vantagem, com as intervenções que definem uma grande parte do panorama artístico actual.
Tornou-se assim cada vez mais difícil evitar o óbvio, tal como há muito acontece com a prática da pintura que descende do passado. O pintor, ao contrário da recomendação de Judd, não pode ignorar esse passado; defronta, porém, analogamente, a sua concorrência e tem de enfrentar o seu considerável peso.
O período de descoberta terminou, como se sabe, para a arte que começa no longínquo período das cavernas; nunca se progrediu a partir daí mas foi possível criar, através dos tempos, sucessivos períodos de invenção formal e expressiva.
Actualmente, só parece possível reformular o que já aconteceu emprestando-lhe, na melhor das hipóteses, um novo significado, através de um novo arranjo dos dados – como num caleidoscópio.
O conhecimento e a meditação sobre o legado da pintura são uma condição essencial da sua prática.
Aliás, torna-se cada vez mais imperioso recorrer à formação académica, isto é, oficinal, no sentido que as corporações medievais e renascentistas bem conheciam. Esse saber fazer não deverá eliminar a inspiração (que não se reduz a uma veleidade romântica) mas o artífice precisa integrar o artista.
Será uma forma de contrariar a proliferação de uma pseudo expressão lúdica e o primarismo dos gestos, disfarçado de regresso à pintura ou de intervenção vanguardista. Os traços e as cores, por si, não bastam para fazer pintura porque a pintura detém, como qualquer expressão artística, uma carga subjectiva que de facto a identifica.
Quanto mais subjectivo o quadro, mais verdadeiro.
A prática da pintura é um estreito caminho que exclui a facilidade e deverá conduzir a um espelhar do mundo até aí não reflectido.
Dominar o vazio da tela é um processo complexo, algo angustiante, que deverá responder à interrogação do pintor – que fazer? Mas o resultado é inseguro.
Há cinquenta anos, no circunstancialismo da polémica abstracção/figuração, afirmei algures que o realismo é sempre novo porque a realidade é sempre outra.
Agora diria que a Pintura é sempre nova porque a realidade é sempre outra.
Nikias Skapinakis, 2008