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José Almeida Pereira – Louro

20.09 01.11.2008
Galeria Fernando Santos (Espaço 531)
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José Almeida Pereira
Louro

Galeria Fernando Santos (Espaço 531)
20.09 – 01.11. 2008

“O título é sempre mais uma cor na paleta” – Marcel Duchamp

O termo louro, que dá o nome a esta exposição, advém da semelhança figurativa de um ícone – uma coroa de louro – presente no trabalho que preenche parte do chão do espaço da galeria. Na realidade a imagem surge da apropriação duma porção de um emblema que contém a figura estilizada de dois ramos de oliveira – símbolo da paz.
No entanto esta imagem é de tal forma sintética que se confunde com uma coroa de louro. A coroa de louro é por sua vez metáfora da vitória e do triunfo, sinal de honorificação e homenagem àquele que é bem sucedido, que se distingue (herança da antiguidade grega). O signo é repetido quatro vezes em cada um dos módulos que correspondem aos mosaicos quadrangulares que desenham o piso da galeria onde se apresenta o trabalho. Alinhados a 90º no sentido das diagonais do quadrado, os signos são distribuídos pelos vértices do enquadramento.

Louro é também a designação familiar de papagaio. Parte da figura desta mesma ave serve-me para elaborar o flyer da mostra. Assim, o termo louro liga-se ao signo das folhas de loureiro que constituem uma das obras da exposição, e à imagem do papagaio que é representado no convite, estabelecendo um diálogo de conceitos como: vitória, triunfo, ornamento (função a que se prestam as folhas de loureiro), condimento (outra finalidade atribuída ao loureiro), repetição e imitação (característica de alguns papagaios), e ainda a cor que oscila entre o amarelo e o castanho-claro.
Acredito que o papagaio é a alegoria que faz convergir as diferentes peças desta exposição. É na verdade o único retrato explícito com ligação à mostra, uma cabeça enquadrada de forma a cortar parte do bico da ave, como se o discurso, sempre patético, fosse motivo de censura. O fragmento do papagaio louro de bico negro é o único complemento aos corpos, representados em parte das telas, que não permitem vislumbrar os rostos dos retratados. É o crânio que não figura no tronco e membros do hipomorfo dourado; é o cérebro dos uniformes, de fato e gravata, que se congratulam na “União”; é a cara que não aparece no túnel de fundo de “Sem título (that’s all folks)”; e é o indivíduo emblemático que se oblitera do centro de “In god we trust”.

Para completar as obras, é visionada, numa sala contígua à primeira (que exibe os trabalhos atrás referidos), uma animação-vídeo que não é mais do que um bailado de marcas de empresas privadas de produtos de consumo. Um bailado em desenho animado, sem cor, apenas com o contorno das formas. A morfologia de toda a animação resulta da função flyper que o ícone da Nike adquire no filme, colocando um dos vértices da marca no centro do ecrã e duplicando o símbolo simetricamente, sendo este vértice o equivalente ao eixo de simetria, o resultado são dois braços contíguos. O filme inicia-se com a tentativa destes dois elementos se tocarem pelos vértices das suas extremidades opostas ao centro que os liga. Este encontro, que resultaria numa estilização que oscila entre o signo de uma seta invertida e o de um coração, nunca se concretiza em todo o tempo da projecção de “O decorrer de outras coisas” (título emprestado a “The way things go” de Peter Fischli e David Weiss). Duas garras, um bigode, um par de asas, até o batman ou o robin, esta configuração da marca Nike, e seu simétrico, constitui a anatomia de uma inúmera possibilidade de significações, mas que ao longo das primeiras dezenas de segundos da animação se faz perceber do que se trata realmente.